Emancipação Político-Administrativa

Óleo sobre tela representando Rafard no período de sua fundação (Pintura de Eliseu de Oliveira)
Óleo sobre tela representando Rafard no período de sua fundação (Pintura de Eliseu de Oliveira)

Fundada pelo cidadão Júlio Henrique Raffard, a cidadezinha que era denominada como “Villa Raffard”, ganha ares de liberdade e a sonhada identidade política e administrativa, por meio, da emancipação e desintegração de Capivari, no ano de 1965.

No ano de 1910, a cidade já possuía 4 mil habitantes. A antiga Usina da União São Paulo, hoje atual, COSAN, uma estação ferroviária FEPASA, e vários pontos turísticos chamaram a atenção dos franceses que tinham cargos de gerência na Usina e tornaram o sonho de muitos rafardenses ainda mais audaz, fazendo com que muitos lutassem pela separação e transformação do distrito em cidade.

Mesmo após brigas com os vizinhos capivarianos, como conta o escritor Silveira Rocha, em seu livro, muitos cidadãos se engajaram na luta pela emancipação, entre eles, o padre Manoel Simões de Lima, da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, José Estanislau do Amaral Filho, o ex-prefeito de Capivari e Luis Ortolani.

Quem foi Júlio Henrique Raffard?

Júlio Henrique Raffard nasceu aos 26 de dezembro de 1851, no Rio de Janeiro, onde seu pai, Eugênio Raffard, era cônsul suíço. Sua descendência era de emigrados franceses, sendo dos Raffard, por parte de pai e dos Lafonte de Montelimart, por parte de mãe. Raffard foi um notável empreendedor. Homem de grande iniciativa fundou o Engenho Central de São João de Capivari, em 1883.

Tudo começou por Júlio Henrique Raffard uma personalidade, muito curiosa possuía vínculos com grupos econômicos ingleses, por causa de suas atividades comerciais, tinha um interesse sobre fatos históricos brasileiros que eram invejáveis. Um homem de visão, extremamente empreendedor, culto e dedicado que fundou o engenho de açúcar e criou um povoado ao seu redor.

Júlio Henrique Raffard

Construção Engenho Central (Capivari)

Usina Rafard 1987
Usina Rafard 1987

No fim do século XIX, o imperador Dom Pedro II, havia incluído em seu plano de governo, a exemplo do que já havia feito em Pernambuco e na Bahia, a montagem de engenhos de açúcar em solo paulista.

A designação era de que fosse construído um Engenho Central no município de Capivari. Em 20 de setembro de 1876, o decreto de número 6.317 fez com que a Companhia a ser construída tivesse sua autorização de funcionamento aprovada. Este mesmo decreto aprovou os estatutos que a regeriam.

O imperador não desiste de seu objetivo e neste ponto da história entram em cena um grande colaborador de Dom Pedro II e personagem conhecido dos brasileiros: Irineu Evangelista de Souza, conhecido como Barão de Mauá.

Mesmo após brigas com os vizinhos capivarianos, como conta o escritor Silveira Rocha, em seu livro, muitos cidadãos se engajaram na luta pela emancipação, entre eles, o padre Manoel Simões de Lima, da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, José Estanislau do Amaral Filho, o ex-prefeito de Capivari e Luis Ortolani.

Barão de Mauá

Homem extremamente prático, Irineu Evangelista de Souza, não demorou a encontrar o homem que seria uma das peças fundamentais para que o desejo de Dom Pedro II se realizasse. Em uma de suas viagens a Paris, para comprar material para construir suas estradas de ferro em território brasileiro, Barão conheceu um engenheiro mauriciano de descendência francesa chamado André Patureau.

André Patureau instalou usinas centrais movidas a vapor feitas de material moderno, para a produção de açúcar evaporado e cristalizado sob vácuo, tornando-o branco através da secagem centrífuga. Sua técnica era muito apreciada, pois, foi uma resposta criativa e urgente aos problemas de concorrência que a França e Inglaterra sofriam com relação ao açúcar refinado de beterraba produzido em modernas usinas construídas por toda a Europa.

Monocultura açucareira

As terras de Porto Feliz, Capivari (Villa Raffard) e Piracicaba foram visitadas e confirmadas por Patureau como sendo a de melhor qualidade e mais adaptável à cultura da cana. A terra era propícia para o plantio da cana-de-açúcar, de clima quente e seco – este foi um dos principais elos para a formação do pequeno povoado que perdura até os dias de hoje, com a Usina (COSAN).

Foram nestas terras, que este senhor começou o árduo trabalho de implantação de seus conhecimentos, técnicas e equipamentos.

Não bastava, entretanto, um técnico renomado para fazer com que os objetivos do imperador acontecessem. Era preciso que um empreendedor talentoso, trabalhador, persistente e visionário aparecesse e se interessasse pela política de concessão de garantia de juros mantida pelo imperador. Essas qualidades e mais o preparo intelectual, comercial e cultural foram encontrados em Júlio Henrique Raffard.

Capivari 1884

O Município de Capivari já era zona canavieira com instalações dispersas em seu território e os senhores de engenho comprometeram-se a cessar suas atividades e direcionar o fornecimento de cana para o Engenho Central.

No entanto, a maioria recusou cumprir o acordo assinado entre as partes, e a safra de 1884 somente foi possível graças às lavouras de cana do Conselheiro Gavião Peixoto e de alguns fornecedores que fiéis ao trato, cumpriram com sua palavra. O início das atividades de fabricação aconteceu em 26 de junho de 1884.

Neste mesmo ano, a Princesa Isabel, filha de Dom Pedro II, herdeira do trono, visita na companhia de seu esposo, filhos e comitiva, Júlio Henrique Raffard.

Villa/ Imigrantes

Júlio Henrique Raffard fundou o Engenho Central de São João de Capivari e o povoado que ficou primeiramente conhecido por “Villa Henrique Raffard”, “Villa Raffard” e anos mais tarde elevada a categoria de Distrito, que pertencia a Capivari, Rafard. Marcando o início da colonização da cidade por imigrantes na sua maioria italianos Júlio Henrique, movimentou a cidadezinha com a indústria açucareira e com a produção de álcool.

Seus primeiros povoadores foram imigrantes italianos que a partir de 1875 foram chegando aos sítios e fazendas da região. Esses mesmos imigrantes viram a “Villa Henrique Raffard” transformar-se em “Villa Raffard” e depois, com o tempo, tornar-se “Raffard”.

Esses homens e mulheres, longe de sua pátria, são tão bem acolhidos nessa nova terra que logo se põe a trabalhar fazendo dela o seu novo lar. A chaminé e sua fumaça não só eram sinais de trabalho como também de dias melhores. Era sinal de que havia perspectiva de que suas famílias ali iriam subsistir.
As grandes moendas do engenho são movidas graças aos braços fortes que alimentam às caldeiras colocando-lhes a lenha. Os mesmos braços que lavram o campo cultivavam as lavouras, cuidavam do campo, semeiam o sonho de uma cidade que um dia seria realidade. Os trabalhadores deste engenho impulsionaram nossa economia. Na época, estes imigrantes que deixando a terra natal sonharam com dias melhores nesta terra tão querida e puseram-se a lavrar a terra. Muitos atletas de fim-de-semana avivavam as colônias com seus campeonatos memoráveis.

Aos poucos, as famílias foram crescendo e partilhando a alegria de começar e vencer. Um povo com o grande desejo de liberdade para conduzir o próprio destino. Cidadãos que com perseverança, luta e alegrias conquistaram sua emancipação. Novas famílias, agora de migrantes brasileiros, buscando construir a felicidade em uma terra acolhedora e hospitaleira, fazem parte também deste cenário.

Ares de uma cidade

Estação de Rafard em 1980
Estação de Rafard em 1980

A estação de Rafard, em 1980, ainda servindo a uma linha operacional apenas para cargas.

O município tinha rede ferroviária – FEPASA, antiga estrada de ferro Sorocabana, a qual tinha ligação com os municípios Capivari e Mombuca (que na época também pertencia a Capivari).

Assim, segundo o escritor, começava a surgir à cidade de Rafard, em 1910, que contava com uma média de 700 habitantes, e mais de 100 prédios e ramificações como: Villa Raffard, Futebol Clube, a Corporação Musical Elite (1939), Igreja Nossa Senhora de Lourdes, Rua Maurício Allain, Ginásio Estadual de Rafard (1987), o Cartório de Registro Civil, o Cemitério, a Agência Postal, que atualmente é conhecida por Correio, dentre outros, estabelecimentos que integrariam a cidade e denominariam suas vielas.

As festas eram realizadas nas datas de aniversário nos clubes Elite e União Rafardense, com sessões musicais, oradores, declamadores e peças teatrais as quais eram atração para toda a população do Distrito.

Idealistas em busca da emancipação

Para o escritor, Rafard contou com a ajuda de muitos idealistas, que lutaram para desmembrar a pátria e conseguir a independência político-administrativa tão sonhado aos rafardenses, entre eles: o padre da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, Manoel Simões de Lima, descontente com esquecimento do Distrito, pela administração municipal de Capivari e pelo investimento no desenvolvimento da cidade, foi ferrenho em seu desejo.

Em 1958, é tentada uma revogação da Lei Orgânica Municipal, pela Comissão Plebiscitária (voto do povo por sim ou não) formada por membros da cidade de Rafard, para transformar-se em município, a cidade teria que ter 2 mil habitantes, 10 quilômetros de distância e uma renda local de Cr$ 300.000,00.

A partir daí, Rafard entraria em uma disputa incessantemente duradoura e cansativa com os vizinhos capivarianos, o então prefeito de Capivari, José Estanislau do Amaral Filho dizia: “Se a lei der esse direito a Rafard, serei o primeiro a apertar a mão dos rafardenses e prestar-lhe a devida colaboração no início de sua vida autônoma. Caso contrário queimarei até o último cartucho do esforço que possa desprender. Tudo farei para não ver Capivari empobrecido de um distrito tão rico e tão poderoso como Raffard”.

Diante da intensa briga entre rafardenses e oposicionistas para que a emancipação acontecesse ou não, enquanto isto o lugar estava tomando formas quer sejam: políticas, sociais, econômicas e angariando pretendentes as tão desejadas eleições e vida totalmente independente de município e não mais de Distrito.

Conclusão

A história do município de Rafard é assim. Uma história profundamente humana. Uma história que continua no coração de cada um de nós, rafardenses com orgulho, que escolhemos essa terra para perpetuar a história das futuras gerações. Súditos que receberam sua princesa Isabel e o bisneto de D. Pedro II. Terra de uma artista genial, Tarsila do Amaral, que aqui sonhou suas obras e levou-as a Semana da Arte Moderna de 22. Um povo com o grande desejo de liberdade para conduzir o próprio destino. Cidadãos que com perseverança, luta e alegria conquistaram sua emancipação!

Curiosidades

Dom Pedro II
Dom Pedro II

DOM PEDRO II, nasceu em 02 de dezembro de 1825 no Estado do Rio de Janeiro e foi batizado como Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Rafael Gabriel Gonzaga. Sucedeu seu pai, Dom Pedro I, que abdicou o trono em 07 de abril de 1831, Dom Pedro II era um homem muito inteligente e estava atento às novidades tecnológicas do seu tempo sempre procurando modernizar o Brasil Império.Júlio Henrique Raffard - Descendente de franceses, nascido em 26 de dezembro de 1851 Raffard transformou em realidade o antigo desejo do imperador, assumindo a construção do Engenho Central e tornando-o realidade.

CONCESSÃO DE JUROS - Dom Pedro II e o ministro da Agricultura, Pedro Luís Pereira de Souza, assinam, em 28 de maio de 1881, o decreto de número 8.123. Este decreto aprovou nova concessão de garantia sobre juros feita diretamente a Júlio Henrique Raffard para assim organizar e estabelecer o Engenho Central no município de São João de Capivari, Província de São Paulo.

GRUPO INGLÊS - Com a concessão em mãos, em 1882, Júlio Henrique Raffard forma sociedade com um grupo inglês, vendendo-lhes parte de seus direitos. Juntos fundavam a “The S. Paulo Sugar Factory of Brazil Limited” e escolheram para a futura indústria açucareira um local que se distanciava apenas 2 quilômetros e meio da cidade de Capivari junto à margem esquerda do rio que recebia o mesmo nome.

FAZENDA LEOPOLDINA - Era uma localização estratégica, pois ficaria próxima da estação Estrada de Ferro Ituana o que facilitaria a escoação da sua produção. Estas terras, chamada de Fazenda Boa Vista e Fazenda Leopoldina - eram de propriedade dos senhores João de Campos Camargo, e do Conselheiro Bernardo Avelino Gavião Peixoto.

FUNDAÇÃO DO ENGENHO - A pedra fundamental do engenho foi lançada em 12 de maio de 1883. A pedra foi assentada pelo Conselheiro Gavião Peixoto, e abençoada pelo padre Haroldo de Camargo Tracy Prado Dautre. A solenidade comemorativa foi muito prestigiada e contou com a presença de autoridades e membros da alta sociedade capivariana.

INOVAÇÕES DO ENGENHO - Ainda em 1883, a “The San Paulo Central Sugar Factor of Brazil Limited” recebeu a transferência da concessão pertencente a Júlio Henrique Raffard. Para a capacidade de moagem de 200 toneladas/dia, o grupo inglês compra caldeiras, moendas, defecadores, tríplices, sistemas de vácuos e outros equipamentos da empresa escocesa “Dale & Kirckaldy”. Nesse período, Raffard contou com André Patureau na área de assessoria técnica e com a ajuda dos especialistas - Henry White e Frederico H. Sawyer, respectivamente cedidos pelo fornecedor dos materiais e pelos acionistas ingleses.

CONTRA - O jornal local “O Progresso”, cujo proprietário era José Miguel Bósio, recusou ajuda ao padre nas colunas do mesmo, por não concordar com a ideia do Distrito se transformar em município.